terça-feira, 3 de dezembro de 2013

Ó Vinde, Adoremos!

Ó Vinde, Adoremos

Extraído do discurso devocional “A Child Is Born” (Um Menino Nos Nasceu), proferido em 9 de dezembro de 2008, na Universidade Brigham Young. Para o texto integral em inglês, entre no site speeches.byu.edu.

Bruce D. Porter
De tudo aquilo que nos aprisiona — pecados, circunstâncias ou acontecimentos passados —, o Senhor Jesus Cristo, o grande Emanuel, veio nos libertar.
Mais de 700 anos antes do nascimento de Jesus Cristo, Isaías profetizou sobre Ele em palavras eternizadas por Georg Friedrich Händel no oratórioO Messias: “Porque um menino nos nasceu, um filho se nos deu, e o principado está sobre os seus ombros, e se chamará o seu nome: Maravilhoso, Conselheiro, Deus Forte, Pai da Eternidade, Príncipe da Paz” (Isaías 9:6).
O Messias, de Händel, também dá gloriosa vida musical à seguinte admoestação baseada em Isaías 40:9: “Tu, ó Sião, que anuncias boas novas (…). Tu, ó Jerusalém, que anuncias boas novas, levanta a tua voz fortemente; levanta-a, não temas, e dize às cidades de Judá: Eis aqui está o vosso Deus”.1
Eis vosso Deus, nascido em Belém e envolto em panos. Eis vosso Deus, nascido na pobreza e simplicidade para caminhar entre as pessoas comuns como homem comum. Eis vosso Deus, sim, o infinito e eterno Redentor, que Se fez carne e veio habitar na própria Terra que Ele criara.
Voltem comigo àquele primeiro Natal sagrado, em Belém, para contemplar o nascimento de nosso Senhor. Ele veio na calada da noite, no meridiano dos tempos, Ele que é Emanuel (ver Isaías 7:14), o Tronco de Jessé (ver Isaías 11:1), o Oriente (ver Lucas 1:78), o Senhor Todo-Poderoso (ver II Coríntios 6:18). Seu nascimento marcou a visita prometida do Criador à Terra, a condescendência de Deus para com o homem (ver 1 Néfi 11:16–27). Como Isaías escreveu sobre o acontecimento: “O povo que andava em trevas, viu uma grande luz, e sobre os que habitavam na região da sombra da morte resplandeceu a luz” (Isaías 9:2).
Sabemos por revelação moderna que o Rei preordenado de Israel veio à Terra na primavera (ver D&C 20:1). Miqueias profetizou que Ele nasceria em Belém — “pequena entre os milhares de Judá” (Miqueias 5:2). O vilarejo de Seu nascimento estava à sombra da poderosa Jerusalém, situada a oito quilômetros ao norte. Jerusalém era a capital da Judeia, sede do templo e bastião do poderio romano. Belém, por outro lado, era uma cidade pastoral, rústica e agrária. Só era conhecida por ser o local de nascimento de Davi, o antigo rei de Israel, por meio de cuja linhagem nasceria Cristo. Portanto, o pequeno povoado era comumente conhecido como a Cidade de Davi. Seu nome hebraico, Beth Lechem, significava “casa de pão”,2 um nome sem nenhum significado particular até o nascimento Daquele que viria a ser conhecido como o Pão da Vida.
Os campos ao redor de Belém abrigavam inúmeros rebanhos de ovelhas; e o início da primavera era o período tradicional de nascimentos. Os pastores ficavam acordados quase todas as noites, cuidando de suas ovelhas sob o límpido céu noturno, por isso os anjos que anunciaram o nascimento do Salvador não precisaram despertá-los.

O Cordeiro de Deus

O menino que chegou naquele período de nascimentos é conhecido como “o Cordeiro de Deus” (João 1:29; 1 Néfi 11:31D&C 88:106). É um título de significado profundo, pois Ele chegou com os cordeiros e, um dia, “como um cordeiro [seria] levado ao matadouro” (Isaías 53:7). No entanto, paradoxalmente, Ele também era o Bom Pastor (ver João 10:11), que Se preocupa com os cordeiros. Assim, esses dois símbolos de Sua vida representam tanto aqueles que servem quanto os que recebem o serviço. Nada mais adequado que Cristo desempenhasse ambos os papéis, pois em vida Ele “desceu abaixo de todas as coisas” (D&C 88:6) e na eternidade “subiu ao alto” e “todas as coisas estão ao seu redor” (D&C 88:6, 41). Ele conhecia a vida de todos os lados e todos os ângulos, tanto acima como abaixo. Aquele que foi o maior Se fez o menor — o Pastor Celestial que Se tornou o Cordeiro.
Sua vinda foi mais do que simplesmente o nascimento de um grande profeta, o advento de um herdeiro prometido ao trono real ou até mesmo a chegada da única pessoa perfeita a jamais viver na Terra. Foi a vinda do Deus do céu “de carne revestido”.3
Jesus Cristo é o Criador do mundo e o Grande Jeová do Velho Testamento. Foi Sua voz que ressoou no Monte Sinai, Seu poder que susteve o povo escolhido de Israel em sua errância e Sua presença que revelou a Enoque, Isaías e todos os profetas a glória do que estava por vir. É nisto que reside o maior milagre da Natividade: quando o Deus e Criador do céu e da Terra Se revelou pela primeira vez em pessoa ao mundo, Ele decidiu fazê-lo como uma criança indefesa e dependente.
Uma antiga tradição hebraica dizia que o Messias nasceria na Páscoa judaica. Sabemos que aquele mês de abril, no meridiano dos tempos, de fato caiu na semana da festa da Páscoa — a sagrada comemoração judaica da salvação de Israel do anjo destruidor que levou a morte aos primogênitos do Egito. Toda família israelita que sacrificou um cordeiro e passou o sangue dele nos umbrais de madeira da casa foi poupada (ver Êxodo 12:3–30). Trinta e três anos após o nascimento de Cristo na Páscoa, Seu sangue manchou as vigas de madeira de uma cruz para salvar Seu povo dos anjos destruidores da morte e do pecado.
A festa da Páscoa pode ter sido a razão pela qual não havia lugar na estalagem para Maria e José. A população de Jerusalém aumentava durante a Páscoa em dezenas de milhares, obrigando os viajantes a buscar hospedagem nas cidades periféricas. Maria e José foram a Belém, terra dos antepassados de José, para participar do recenseamento imperial ordenado por César Augusto. Para atender às exigências do recenseamento, eles poderiam ir a Belém em qualquer época do ano, mas é provável que tenham escolhido a Páscoa porque a lei mosaica exigia que todos os homens se apresentassem em Jerusalém nessa festa.4 Como Belém ficava muito perto da Cidade Santa, o casal de Nazaré poderia cuidar das duas obrigações ao mesmo tempo.
O estalajadeiro acabou entrando para a história negativamente. No entanto, dada a aglomeração em toda a região durante a Páscoa, não podemos culpá-lo por não ter vaga para o casal de Nazaré. Enquanto a maioria dos peregrinos da Páscoa acampava em milhares de tendas erguidas nas planícies ao redor de Jerusalém, milhares de outras pessoas procuravam refúgio nos abrigos locais, conhecidos como caravançarás. Não há dúvidas de que a estalagem de Belém estava lotada; e é bem provável que a sugestão do estábulo feita pelo estalajadeiro tenha sido um ato de bondade genuína.
Mesmo que o casal encontrasse lugar na hospedaria, a acomodação também teria sido bastante rústica. Um caravançará típico daquela época era uma estrutura de pedra constituída de uma série de pequenos cômodos, cada um com apenas três paredes e aberto de um lado. É bem provável que o estábulo, por outro lado, fosse um pátio murado ou até mesmo uma gruta de calcário, onde eram guardados os animais pertencentes aos hóspedes.5 Quer tenha ocorrido num pátio, numa gruta ou em outro refúgio, o nascimento de Cristo no meio dos animais teve uma vantagem evidente em relação ao interior lotado de uma estalagem: ali pelo menos havia paz e privacidade. Nesse sentido, a oferta do estábulo foi uma bênção, permitindo que o nascimento mais sagrado da história da humanidade acontecesse em reverente solidão.

Liberdade para os Cativos

Sete séculos anos antes daquele primeiro Natal, o profeta Isaías escreveu uma profecia messiânica que o Salvador posteriormente viria a ler para Seus concidadãos de Nazaré: “O Espírito do Senhor Deus está sobre mim; porque o Senhor me ungiu, para pregar boas novas aos mansos; enviou-me a restaurar os contritos de coração, a proclamar liberdade aos cativos, e a abertura de prisão aos presos” (Isaías 61:1; ver também Lucas 4:18–19).
Ao lermos sobre a missão de Cristo de proclamar a liberdade aos cativos e abrir as portas da prisão para aqueles que estão acorrentados, é provável que pensemos primeiro em Seu ministério no mundo espiritual entre os mortos. Mas todos nós somos cativos — cativos da corrupção e da fraqueza de um corpo mortal e sujeitos às tentações da carne, à enfermidade e, por fim, à morte — e todos precisamos ser libertados.
De tudo aquilo que nos aprisiona — pecados, circunstâncias ou acontecimentos passados — o Senhor Jesus Cristo, o grande Emanuel, veio nos libertar. Ele proclama a liberdade aos cativos e a liberdade dos grilhões da morte e da prisão do pecado, da ignorância, do orgulho e do erro. Foi profetizado que Ele diria aos prisioneiros: “Saí” (Isaías 49:9). A única condição de nossa liberdade é que nos acheguemos a Ele com o coração quebrantado e o espírito contrito, nos arrependamos e procuremos fazer Sua vontade.
Há cerca de 30 anos, conheci um homem a quem chamarei de Thomas. Ele tinha 45 anos quando o conheci. Vinte anos antes, seus pais tinham se filiado à Igreja. Thomas não demonstrou o menor interesse na nova religião dos pais. Mas seus pais o amavam e nutriam a esperança de que um dia o filho fosse levado a conhecer a verdade do evangelho restaurado. Com o passar dos anos, eles tentaram várias vezes convencê-lo a pelo menos receber a visita dos missionários e ouvir sua mensagem. Ele se recusou obstinadamente e zombava dos pais por causa de sua fé religiosa.
Certo dia, desesperada, a mãe disse: “Thomas, se você ouvir as palestras missionárias uma única vez, prometo nunca mais tocar no assunto da Igreja com você”. Thomas aceitou o trato e concordou em ouvir os missionários. Nas três primeiras palestras, simplesmente se sentou impassível, cheio de orgulho, ocasionalmente caçoando das palavras dos élderes.
Na quarta palestra, acerca da Expiação de Jesus Cristo e dos primeiros princípios do evangelho, Thomas não disse nada, mas ficou num silêncio incomum e passou a ouvir com atenção. Ao fim da lição, os élderes prestaram testemunho do Salvador. Foi então que um dos missionários se sentiu inspirado a abrir a Bíblia e ler estas palavras:
“Vinde a mim, todos os que estais cansados e oprimidos, e eu vos aliviarei.
Tomai sobre vós o meu jugo, e aprendei de mim, que sou manso e humilde de coração; e encontrareis descanso para as vossas almas” (Mateus 11:28–29).
Sem aviso prévio, Thomas irrompeu em pranto. “Estão tentando dizer que Cristo pode perdoar-me de meus pecados?” perguntou ele. “Já fiz coisas terríveis na vida. A lembrança de meus pecados me atormenta. Eu faria qualquer coisa para me livrar da culpa que sinto.”
Seu orgulho tinha sido uma fachada que ocultava uma alma prisioneira do pecado e da culpa. Os élderes garantiram a Thomas que Cristo lhe perdoaria e o livraria do peso da culpa caso ele se arrependesse e fosse batizado e confirmado. Em seguida, prestaram testemunho do poder da Expiação. Daquele momento em diante, tudo mudou na vida de Thomas. Ele tinha muito do que se arrepender e muito a sobrepujar, mas por meio das bênçãos do Senhor ele se tornou digno do batismo.
Mais de 20 anos depois, ao sentar-me na capela do Templo de Frankfurt Alemanha, um homem de cabelos grisalhos à minha frente virou-se e perguntou: “O senhor não é o Élder Porter?” Para minha grande alegria, reconheci Thomas — um homem liberto da escravidão pelo poder de Jesus Cristo e ainda fiel à Igreja de Senhor.
Talvez este Natal seja a ocasião de assumirmos a determinação de buscar o Pai Celestial humildemente em oração e pedir que o poder de Seu Filho Amado esteja conosco em nossa vida diária e nos liberte de nossas formas pessoais de cativeiro, grandes ou pequenas.

Ó Noite Santa

Em dezembro de 1987, cerca de duas semanas antes do Natal, viajei para Israel a trabalho. Infelizmente não era um momento de paz na Terra Santa. Havia manifestações na Cisjordânia, as ruas da Cidade Velha de Jerusalém estavam desertas e as lojas estavam fechadas com tábuas. A tensão política no ar era palpável e, para piorar a situação, choveu e fez frio durante quase toda a semana. Com medo da violência, a maioria dos turistas evitava aquela região. No entanto, ao andar por Jerusalém, senti paz no coração por saber que estava na cidade que o Redentor tanto amava.
Voltei para os Estados Unidos na noite de sexta-feira antes do Natal. Quando o Dia do Senhor amanheceu, dois dias depois, meu despertador me acordou ao som da música “Ó Noite Santa”:
O Rei dos reis nasceu numa pobre manjedoura,
Para ser, em todas as nossas provações, nosso amigo.6
A música e a mensagem me tocaram profundamente, e chorei ao pensar no glorioso sacrifício e na vida perfeita do Redentor de Israel — Aquele que nasceu para ser o amigo dos humildes e a esperança dos mansos. Pensei no que vivenciei em Jerusalém, e todo o meu ser se encheu de amor por Aquele que viera à Terra e tomara sobre Si os fardos de todos nós. Foi arrebatador pensar que Ele podia me considerar um amigo. Nunca esqueci os doces sentimentos daquela manhã de domingo, que foram o testemunho mais puro que já recebi.
Presto testemunho do Salvador do mundo. Sei que Ele vive. Sei que foi preordenado antes da Criação do mundo para proclamar a liberdade aos cativos. Em virtude de Seu nascimento e Sua vida, digo: “Ó vinde, adoremos”.7

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